terça-feira, 3 de setembro de 2013

O pior analfabeto é o analfabeto midiático.

Por Celso Vicenzi
Ele ouve e assimila sem questionar, fala e repete o que ouviu, não participa dos acontecimentos políticos, aliás, abomina a política, mas usa as redes sociais com ganas e ânsias de quem veio para justiçar o mundo. Prega ideias preconceituosas e discriminatórias, e interpreta os fatos com a ingenuidade de quem não sabe quem o manipula. Nas passeatas e na internet, pede liberdade de expressão, mas censura e ataca quem defende bandeiras políticas. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. E que elas – na era da informação instantânea de massa – são muito influenciadas pela manipulação midiática dos fatos. Não vê a pressão de jornalistas e colunistas na mídia impressa, em emissoras de rádio e tevê – que também estão presentes na internet – a anunciar catástrofes diárias na contramão do que apontam as estatísticas mais confiáveis. Avanços significativos são desprezados e pequenos deslizes são tratados como se fossem enormes escândalos. O objetivo é desestabilizar e impedir que políticas públicas de sucesso possam ameaçar os lucros da iniciativa privada. O mesmo tratamento não se aplica a determinados partidos políticos e a corruptos que ajudam a manter a enorme desigualdade social no país.
Questões iguais ou semelhantes são tratadas de forma distinta pela mídia. Aula prática: prestar atenção como a mídia conduz o noticiário sobre o escabroso caso que veio à tona com as informações da alemã Siemens. Não houve nenhuma indignação dos principais colunistas, nenhum editorial contundente. A principal emissora de TV do país calou-se por duas semanas após matéria de capa da revista IstoÉ denunciando o esquema de superfaturar trens e metrôs em 30%.
O analfabeto midiático é tão burro que se orgulha e estufa o peito para dizer que viu/ouviu a informação no Jornal Nacional e leu na Veja, por exemplo. Ele não entende como é produzida cada notícia: como se escolhem as pautas e as fontes, sabendo antecipadamente como cada uma delas vai se pronunciar. Não desconfia que, em muitas tevês, revistas e jornais, a notícia já sai quase pronta da redação, bastando ouvir as pessoas que vão confirmar o que o jornalista, o editor e, principalmente, o “dono da voz” (obrigado, Chico Buarque!) quer como a verdade dos fatos. Para isso as notícias se apoiam, às vezes, em fotos e imagens. Dizem que “uma foto vale mais que mil palavras”. Não é tão simples (Millôr, ironicamente, contra-argumentou: “então diga isto com uma imagem”). Fotos e imagens também são construções, a partir de um determinado olhar. Também as imagens podem ser manipuladas e editadas “ao gosto do freguês”. Há uma infinidade de exemplos. Usaram-se imagens para provar que o Iraque possuía depósitos de armas químicas que nunca foram encontrados. A irresponsabilidade e a falta de independência da mídia norte-americana ajudaram a convencer a opinião pública, e mais uma guerra com milhares de inocentes mortos foi deflagrada.
O analfabeto midiático não percebe que o enfoque pode ser uma escolha construída para chegar a conclusões que seriam diferentes se outras fontes fossem contatadas ou os jornalistas narrassem os fatos de outro ponto de vista. O analfabeto midiático imagina que tudo pode ser compreendido sem o mínimo de esforço intelectual. Não se apoia na filosofia, na sociologia, na história, na antropologia, nas ciências política e econômica – para não estender demais os campos do conhecimento – para compreender minimamente a complexidade dos fatos. Sua mente não absorve tanta informação e ele prefere acreditar em “especialistas” e veículos de comunicação comprometidos com interesses de poderosos grupos políticos e econômicos. Lê pouquíssimo, geralmente “best-sellers” e livros de autoajuda. Tem certeza de que o que lê, ouve e vê é o suficiente, e corresponde à realidade. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e o espoliador das empresas nacionais e multinacionais.”
O analfabeto midiático gosta de criticar os políticos corruptos e não entende que eles são uma extensão do capital, tão necessários para aumentar fortunas e concentrar a renda. Por isso recebem todo o apoio financeiro para serem eleitos. E, depois, contribuem para drenar o dinheiro do Estado para uma parcela da iniciativa privada e para os bolsos de uma elite que se especializou em roubar o dinheiro público. Assim, por vias tortas, só sabe enxergar o político corrupto sem nunca identificar o empresário corruptor, o detentor do grande capital, que aprisiona os governos, com a enorme contribuição da mídia, para adotar políticas que privilegiam os mais ricos e mantenham à margem as populações mais pobres. Em resumo: destroem a democracia.
Para o analfabeto midiático, Brecht teria, ainda, uma última observação a fazer: Nada é impossível de mudar. Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
O analfabeto político
O pior analfabeto, é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha
Do aluguel, do sapato e do remédio
Depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que
Se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil,
Que da sua ignorância nasce a prostituta,
O menor abandonado,
O assaltante e o pior de todos os bandidos
Que é o político vigarista,
Pilanta, o corrupto e o espoliador
Das empresas nacionais e multinacionais.

Bertold Brecht
Extraído do site Outras Palavras

6 comentários:

  1. Pra mim véio ZAN, o pior analfabeto é o politico imundo, salafrário, corrupto, ladrão que pensa que pode tudo........

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  2. Esse político aí, coitado, não é obra de geração espontânea ou chegou ao planeta numa nave espacial, vindo de Saturno ...ele só existe porque o santo do eleitorado, desgraçado, assim o quer e o elege religiosamente de dois em dois ou de quatro em quatro anos...

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  3. Que coisa horrível: ESSE MIDIÁTICO SERIA AQUELE FÃ DA MÍDIA - QUE SÓ ESCREVE E SÓ LÊ COISAS DA MÍDIA, ESPECIALMENTE DESSA VIRTUAL QUE NÃO TEM CORPO E NEM ALMA? E PENSANDO QUE SABE QUAL MESMO SUA HISTÓRIA? EU EXISTO SIM, SOU A PRÓPRIA HISTÓRIA, DITA E ATUAL, FEITA POR MIM MESMO. SEM SER JAMAIS PERSONAGEM DOS TIPOS "históricos", DOS HONORÁVEIS BANDIDOS.

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  4. E a mídia falando da mídia? Que Milagre, só que deve ter sido um profundo engano. Tem gente que é cega e não sabe.

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  5. E a nossa mídia local? Se você põe suas “oiças" para ouvir determinados apresentadores, em programas que veiculam notícias e informações e tiver um mínimo de senso crítico, vai ficar sem entender nada. O que hoje eles criticam, ontem estavam com estes mesmos. Foram inclusive crias de determinados esquemas políticos. E ainda hoje, de vez em quando têm recaídas, e rasgam seda por seus criadores. São os sabidos que manipulam uma massa acrítica. Midiáticos analfabetos é que eles não são. O nosso analfabeto midiático por certo estufa o peito e diz, que ouviu tal notícia no programa tal, de tal locutor/apresentador. E neste caldo midiático da terra dos herois do jenipapo, ainda podemos ouvir alguma voz que com certeza se propaga em alguma outra frequencia. Ainda bem.

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  6. a midia local padece do mesmo mal de que padece a midia piauiense no seu todo, ou seja, quase ninguém consegue ser totalmente livre da influência nefasta dos interesses dos chamados "donos da voz", o empresário da midia que tem interesse em fazer o jogo político de político ou partido a ou b, sendo pago pra isso e dando a respectiva migalha para o locutor ou apresentador ou redator do blog ou portal que faz o que faz porque é pago pra isso...de um modo geral, o ouvinte médio ou o cara que acessa o portal vai atrás da informação que lhe interessa, ou seja, a que fala bem de seu lider político e mau do seu adversário...e conseguir se informar no meio desse jogo de interesse sem compromisso nenhum com nenhum tipo de verdade factual, fica quase impossível...o analfabeto midiático típico é aquele cara que sabe ler e escrever mas não está interessado em saber ou fazer da informação algo que lhe instrua minimamente...o analfabeto de pai e mãe, que não sabe ler nem escrever e escuta rádio ou vê televisão, esse aí vai morrer achando que o único jeito de acabar com a violência é matando bandido, porque na midia brasileira o que mais tem é "justiceiro" pregando a pena de morte com as próprias mãos pra quem vive num fogo cruzado impossível de se saber quem é bandido e quem é polícia, mas aí já é outro filme...

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